quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

David Carneiro (in memorian)*

David Carneiro (in memorian)*
11/11/2002

Sempre comemoramos no mesmo dia o aniversário de meu Pai e a festa da cidade. Ele tinha um certo orgulho íntimo de ter tido certo sempre seu nome tão diretamente vinculado ao de sua cidade. Esta cidade que se transformou numa “urbs” crescente, partindo do estado de pequena cidade interiorana, cujo avanço ele muitas vezes lamentou. Mas não fazia um passeio por suas lembranças sem voltar entusiasmado: “como Curitiba está linda...”; ou: “como cresceu!... talvez um pouco demais... para meu gosto”. Dizia ele.

Nascido na parte central da cidade velha, na atual Rua Mateus Leme, ainda criança passou a viver na região que mais tarde seria o Batel, tendo conhecido, quando menino, os rios e os bosques antigos; falava muito do verdadeiro pantanal que era a Praça Santos Andrade, e, por isso mesmo, dos muitos sapos que ali coaxavam. Por seus arriscados caminhos ninguém se aventurava a passar ao começar a noite, não por qualquer risco de assalto, mas porque por um descuido qualquer pessoa podia afogar-se na lama.

Tendo vivido no Rio de Janeiro, onde passou parte de sua adolescência, atribuía àquela cidade parte considerável dos problemas administrativos e políticos que o país enfrentava. Certa vez, em casa dos Carneiro de Mendonça, teve forte altercação com Carlos Lacerda, o Jornalista em evidência que se preparava para ser político de expressão nacional. A causa era a nova capital, Brasília, cuja fundação David Carneiro defendia ardorosamente ao passo que Lacerda então se iniciava e este pediu a meu Pai que escrevesse livro apresentando suas razões; ele escreveria outro replicando com argumentos contrários. David Carneiro voltou para casa e escreveu “Brasília e os Problemas da Federação Brasileira”, que encaminhou a Lacerda. Ficou sem resposta ou comentário.

Muitos anos mais tarde, viveu algum tempo na nova capital que sempre lhe pareceu ter contribuído para dar feição nova a nosso país. A questão universitária desde então passou a empolgá-lo e sobre ela escreveu muito, tanto em livros quanto em artigos de sua “Veterana Verba”. Mas sua cidade natal era sempre a sua menina dos olhos; especialmente a partir dos tempos em que ela passou a usufruir universal notoriedade.

Há mais uma pessoa ausente nas festas de comemoração: David Carneiro. Mas entre nós, seus velhos amigos, estaremos lembrando muitas das lembranças que ele desfiava para nós: “ da minha Curitiba”; da jovem centenária que, ao que tudo indica, se rejuvenesce com o passar do tempo...

Fenômeno que teria desejado mas não viveu o suficiente para testemunhar.

• *David Carneiro Júnior é engenheiro e economista, professor da Universidade Estadual de Maringá.
• O historiador David Carneiro faleceu em agosto de 1991, aos 86 anos de idade.

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